Portal Naturlink

Castanheira de Pera e o Encanto das Caminhadas

O bom tempo convida-nos a passeios por paisagens naturais, que nos proporcionem o contacto com sons, cheiros e imagens tantas vezes esquecidos. Por isso lhe propomos uma viagem ao passado e ao presente, em terras da Serra da Lousã.

Como que saída de um conto de fadas, a bucólica vila de Castanheira de Pera surge-nos por entre as encostas da Serra da Lousã. O caminho que se percorre até lá chegar já não é o sinuoso de curvas e contra curvas apertadas; agora o IC8 levou as curvas que durante tanto tempo impediram as gentes de se aventurarem por outras paragens, e essas mesmas gentes desejam agora partir para longe da terra que durante tanto tempo as isolou do mundo.

Castanheira de Pera foi terra de indústria. Os ventos da Revolução Industrial despertaram o pioneirismo que levou os castanheirenses a transformar as águas das ribeiras em força motriz, dinamizadora da indústria de lanifícios, em tempos considerada a terceira maior do país. Agora resta o silêncio e as ruínas das fábricas que se amontoam ao longo das ribeiras.



A natureza vai encontrando pouco a pouco o seu equilíbrio perturbado pelos constantes rios de tinta que foram despejados nas suas ribeiras, ou os pedaços de tecidos que iam ficando presos às árvores ribeirinhas como fantasmas. Já não há mais o bulício dos trabalhadores, nem das sirenes das fábricas, nem de camiões, nem de nada. A natureza regressa de novo a sua casa.

É de novo a Serra da Lousã que abraça por vales e montes todo o concelho. Para aqueles que não conhecem é talvez difícil acreditar que em tão pouco espaço exista uma tal diversidade de cenários naturais. Os cabeços forrados a urze multicolor, matéria prima para o Mel da Serra da Lousã, escondem recantos onde se ouve o tilintar das águas que percorrem, saltitantes, as escarpas graníticas e xistosas, ladeadas por bosques de carvalhos, castanheiros, abetos, ciprestes e tantas outras pinceladas de tons que dão o mote para o nosso passeio.

Também é curioso notar que, não sendo esta área uma zona protegida, as suas riquezas naturais têm estado protegidas dos incautos, e permanecem ali belas e inexploradas.

O passeio que se sugere passa por alguns dos cenários que aqui foram descritos.

Como chegar?

A melhor forma de chegar a Castanheira de Pera é através do IC8, apanhando depois a EN 236. Chegando ao centro da vila segue-se no sentido do Coentral Grande até à Ponte da Pedra, que se encontra um pouco depois de Sarnadas, e onde o nosso passeio começa.

1ª Etapa – Ponte da Pedra – Coentral Grande

A Ponte da Pedra é uma pequena ponte de pedra (como o nome indica), que atravessa a bela ribeira de Pera. Por ela passaram muitos carros de bois carregados com a neve que era recolhida nos Poços da Neve, construídos no cume da Serra da Lousã, e transportada até ao rio Zêzere, onde ia em barcaças até Lisboa. Lá, entre outras funções, servia para fazer gelados que eram vendidos no café Martinho da Arcádia e na corte para os deleites reais. A esta neve chamava-se “Neve Real” e eram concedidos especiais favores a quem a transportasse, os neveiros.

Pois também por esta ponte vamos passar e seguir durante algum tempo o caminho percorrido pelos neveiros. Este caminho, ao exemplo da ponte, é todo construído em pedra e os seus muros, forrados a musgo, percorrem as margens da ribeira. Os carvalhos e os castanheiros de copas frondosas preenchem o espaço e alguns atestam mesmo a sua antiguidade, com os seus troncos enrugados e contorcidos. Pelo chão coberto de folhas podemos encontrar pequenas flores coloridas, fetos reais, dedaleiras e outras espécies que por ali proliferam.

Nas margens da ribeira de Pera encontraremos, durante o nosso percurso, construções de pedra, que eram na sua maioria antigos moinhos movidos pela força hidráulica, dos quais não restam senão as paredes e alguns pedaços dos engenhos que um dia lhes deram vida. Foram já base de sustento, mas as novas tecnologias e o desencanto condenaram à morte estes espaços de vida, histórias e cultura.

Seguindo até o Coentral do Fojo, uma pequena povoação quase desabitada, podemos reparar num pequeno engenho construído com roldanas e peças de bicicleta, que servia para aproximar as duas margens da ribeira, que a esta altura se tornam escarpadas. Ali eram atravessadas as cartas e o pão, colocados no fio que já não existe.

Vamos aos poucos entrando na aldeia do Coentral Grande, onde a natureza no seu estado mais selvagem é substituída por uma natureza mais intervencionada pelo homem. O verde vai dando lugar às casas, suas hortas e quintais. Por aqui e por ali um cão ou um gato aparecem curiosos, e ouvem-se já os sorrisos distantes de alguma criança, entrecortados pelo sino da igreja.

O Coentral Grande é uma pequena aldeia serrana que em tempos foi terra de neveiros. A sua capela altaneira, encimada por grandes carvalhos, foi erigida em honra de Nossa Senhora da Nazaré do Coentral. De uma só nave e três altares, a sua construção remonta a 1691, e a sua beleza vale pela sua simplicidade.

2ª Etapa - Coentral Grande – Vale Silveira

Do Coentral seguimos em direcção ao Vale Silveira, por entre ruas estreitas e casario serrano. Chegando a uma bifurcação de estrada de alcatrão com outra de terra batida, seguimos pela de terra batida, embrenhando-nos mais uma vez numa frondosa floresta de carvalhos, abetos, medronheiros, ciprestes, faias e figueiras.

Este é um bom pretexto para encher os pulmões de ar fresco, respirar fundo e deixar o olfacto ser invadido por odores verdejantes, de múltiplas origens. À medida que nos vamos aproximando do Vale Silveira os sons da ribeira vão-se tornando mais próximos e apercebemo-nos da existência de uma cascata onde a água se precipita pedra sobre pedra e desaparece saltitante.

Chegamos, então, a um local onde existe uma pequena ponte de madeira, que atravessamos para nos depararmos com um magnífico vale verdejante, forrado a verde, com árvores de inigualável beleza e intemporalidade. Por ali podemos demorar-nos e aproveitar para imaginar como teria sido a vida daqueles que já nem o tempo lembra, e que ali habitaram. Agora o silêncio, a serenidade, a paz e o equilíbrio pleno que só a natureza e a sua perfeição conseguem, inundam aquele espaço, destinado apenas a alguns privilegiados, que o visitam e que nele sabem fruir tanta energia e tanta beleza.

É altura de regressar. Podemos seguir pela levada de água, que nos levará de novo à aldeia do Coentral, e dali seguir até à Fonte das Bicas, fonte centenária com um espaço de lazer e descanso contíguo. Dali seguimos pelas traseiras da aldeia por uma estrada de pedra calcetada, que no levará até à ponte do Cavalete, local de confluência entre a ribeira do Cavalete e a de Pera, e já em estrada de alcatrão, seguimos uns escassos metros até ao local onde os carros ficaram estacionados. Aqui acaba um dos muitos passeios que se podem fazer na Serra da Lousã.

Alguns cuidados que não pode esquecer quando realizar caminhadas:
Os impactos de uma caminhada para o ecossistema visitado podem ser muito negativos e irreversíveis se não forem tomadas precauções, que vão desde a formação de grupos pequenos, à utilização dos trilhos existentes, a recolha do lixo, o silêncio, a não recolha de espécies vegetais ou quaisquer outras e o respeito pelas populações. Depois não se esqueça do calçado confortável, a roupa de algodão, o chapéu e a garrafa de água para poder encher nas fontes com água fresca que encontrará pelo caminho. A máquina fotográfica é sempre uma boa alternativa para quando quiser eternizar uma paisagem ou um pequeno detalhe.

Então Boas Caminhadas!

Contactos úteis:

- Alojamento – A Albergaria O Lagar, um espaço acolhedor nas imediações da Vila de Castanheira de Pera – 236 430120 ;

- Onde comer – Churrasqueira Castanheirense, onde se come bem e barato, também na vila – 236 432257 ; Poço Corga, situado na praia fluvial que dá o nome ao restaurante – 236 432923 ;

- Posto de Turismo – 236 430280 ;

por Joana Oliveira

http://www.naturlink.pt/canais/Artigo.asp?iArtigo=6218&iLingua=1

publicado em Junho 2000

Sem comentários: